Andrea Moreno: “A desvalorização do KZ certamente irá beneficiar quem repatriar capitais”

ANDREAMORENO

Andrea Moreno: “A desvalorização do KZ certamente irá beneficiar quem repatriar capitais”

Notícia: https://www.novafrica.co.ao/economia/andrea-moreno-a-desvalorizacao-do-kz-certamente-ira-beneficiar-quem-repatriar-capitais/

Gostaríamos de começar por conhecer em resumo o que faz a WCA em Angola?

A World Compliance Association é uma associação fundada em Espanha, estando presente em oito países, e em Angola – onde recentemente foi estabelecido o Capítulo –, possuímos cerca de 190 membros, representantes de 72 empresas de diversos sectores, desde a banca a transportes, farmacêutico, indústria e petróleo. Em Maio, realizámos o 1.º Congresso de profissionais do compliance em Angola, que superou as nossas expectativas, porque tivemos a presença de mais de 250 pessoas.

O Capítulo Angola foi fundado por três entidades, nomeadamente pela Petroshore, empresa dedicada a formação e consultoria na área de compliance, pelo Grupo Mieres Angola, que é uma empresa de serviços e parcerias internacionais, e pela Academia BAI, que actua na área das formações.

A nossa proposta é, resumidamente, levar as pessoas a conhecer melhor o que é o compliance, realizar a divulgação das melhores práticas internacionais, certificar organizações com a ISO 37001 (anticorrupção), organização de eventos, desenvolver certificações profissionais internacionais, fomentar a formação em compliancenos seus diversos âmbitos, com especial referência à certificação internacional de compliance officer,que está agora a decorrer onde teremos os primeiros compliance officers formados em Angola com a nossa certificação internacional.

Estes formandos são um sinal de que as organizações começam a interessar-se mais pelas questões do compliance?

A maioria dos formandos desta primeira edição é proveniente de organizações bancárias e dos seguros, porque é onde reside a maior obrigatoriedade do compliance regulatório internacional. Porém, o compliance é transversal a todas as empresas, como prova disto, ressalta-se a Lei n.º 03/14, que impõe a responsabilidade penal à pessoa jurídica, que exige às organizações um modelo de vigilância e controlo, em outras palabras, exige um sistema de compliance– estabelecido antes da comissão do delito, pois, para eximir a responsabilidade penal corporativa, deve-se fazer prova de que o agente actuou a contra-ordem do estabelecido pela organização, e isso é o compliance.

As pessoas ainda não estão muito familiarizadas, nem com o compliancenem, curiosamente, com esta legislação.

Há que se diferenciar o compliance regulatório, que é exigido por meio de legislações nacionais e internacionais. Logo, temos compliance interno, que abrange toda a organização por meio de autoregulação e cultura de cumprimento. Sobre a matéria de compliancepenal, em Outubro temos também outro evento que versará sobre a prevenção e investigação de fraudes empresariais. Porque a dificuldade que existe está na investigação, é preciso saber como detectar uma fraude e depois como investigá-la de forma efectiva.

Mas as grandes operadoras que estas servem não deviam impor os mesmos níveis de controlo e de compliance que praticam?

Existe de facto um controlo que, aliás, ocorre na hora da avaliação do fornecedor, através da diligência devida (due diligence) para certificar que possuem sistemas de compliancee cumprem as boas práticas internacionais. Normalmente, só contratam as que têm as melhores práticas, mas dificilmente ocorrem auditorias periódicas, um acompanhamento que certifica que o fornecedor está a cumprir com o que foi apresentado. Existem vários casos de empresas que ganham concursos, mas que depois acabam por subcontratar uma terceira empresa, a qual não corresponde com os requisitos, e o oil major não é informado.

Por esta razão, hoje todos os operadores acordaram para isso e estão a exigir mais e a realizar um maior acompanhamento dos fornecedores. Logo, existem também organismos nacionais que deveriam executar um maior controlo sobre a área do compliancen as empresas. Porém, como isso tudo é muito novo, falta formação. Até faz pouco tempo, associava-se o compliance unicamente à banca e anticorrupção.

Há empresas ou organismos do Estado interessados em que a WCA melhore os seus níveis de transparência?
 
Temos consultas, sim, enquanto associação, por parte dos membros associados, que nos realizam consultas pontuais e desejam certificar-se nos padrões internacionais de qualidade, como, por exemplo, a Bonws Seguros, que tem um grande compromisso com o compliance. Porém, a nível institucional, a ideia não é entrar em temas específicos de uma determinada empresa, mas em tudo o que pode ser interesse geral, e servir a sociedade e o Estado e trabalhar conjuntamente com outras associações.

Um exemplo de assuntos de interesse geral é a questão do RGPD (Regulamento Geral da Protecção de Dados), já que recentemente todos fomos “bombardeados” com e-mails de empresas internacionais para actualização das políticas de protecção de dados, e recebemos estes e-mails porque no dia 25 de Maio de 2018 entrou em vigor uma directiva europeia, sobre a regulamentação da protecção de dados pessoais. Essa regulamentação de dados exige, entre outros aspectos, que as pessoas dêem o seu consentimento expresso para receber informação comercial, e quase não se falou sobre o assunto de forma explicativa e detalhada na imprensa localmente, e por isso realizámos no passado dia 14 de Junho um pequeno-almoço para debate da matéria.

Quais são os aspectos mais relevantes dessa regulamentação?

Há alguns aspectos principais. O primeiro é que ela é extraterritorial. Ou seja, se uma empresa presta serviços na Europa, ou a cidadãos residentes europeus, tratando ou não os dados pessoais destes numa base de dados na Europa, automaticamente a empresa torna-se uma pessoa obrigada a cumprir com a RGPD. É nesse sentido que, não só em Angola mas em todos os países, as empresas que prestam serviços na Europa, ou a cidadãos europeus lá residentes, se tornam pessoas obrigadas.

Na Europa, foi unificada a livre circulação de dados nos Estados-membros, mas também obriga que aquela pessoa que vai ser alvo de propagandas de qualquer tipo tenha uma protecção, porque os dados são seus, é propriedade legítima. Nesse contexto, é muito importante a adequação, pois estamos a falar de uma legislação que impõe multas, que são 4% do seu facturamento ou 20 milhões EUR. Outra das questões que o RGPD exige é não reter os dados pessoais de uma pessoa por tempo maior do que o necessário.

Esta directiva coincide com os escândalos recentemente descobertos envolvendo o Facebook…

A directiva vem de há dois anos e precisou deste tempo para ser implementada. O que vem acontecendo com o Facebook foi outro caso, que coincidiu no tempo: depois de ter respondido nos EUA, o CEO do Facebook teve de ir à Europa, onde claramente lhe foi indicado que o nível de exigência de protecção de dados nos EUA é inferior ao da Europa. Assim, deve adequar-se ao mercado europeu, caso queira seguir neste mercado.

Sobretudo, deve-se considerar que, hoje em dia, os dados são assetou seja, valem mais que o petróleo, e constituem uma oportunidade de negócio no mundo moderno, para o qual Angola já se está a preparar. Pois “quem tem dados tem tudo”, pode saber desde onde se está, o que se faz, preferências, e também elaborar perfis, isso é algo muito importante, mas que deve ser controlado de forma a não violar os direitos individuais. (Mercado)”